sábado, 17 de maio de 2008

Game Over - Educação Substituída

Por Indyra Tomaz e Tatiana Fortes

Na comunidade do Poço da Draga, localizada no entorno da Praia de Iracema, em Fortaleza, a procura pela biblioteca e brincadeiras de rua foram substituídas pela Lan house. Crianças de 10 a 14 anos, procuram o local para acessar sites de relacionamentos como Orkut e MSN, já que a hora de uso custa entre R$ 1,00 e R$ 1,50, um valor inferior as demais lan houses da cidade. Segundo Franciedna Maria Moreira do Nascimento, 29, mãe e dona de casa, "o valor cobrado na lan house é barato, e nossos filhos vão pra lá todos os dias. Tenho medo do que possa acontecer, já que existem tantos crimes e exploração sexual na internet".

A lan house do Fabinho, como é conhecido o proprietário do local, 20, tem um número de acesso que chega a 50 por dia, isso porque o valor cobrado é menor em relação às lan houses de outros bairros, que podem custar até R$ 5,00 a hora. A loja abre às 09h e fecha às 22h, funciona de segunda a segunda. Pela manhã o lugar é mais freqüentado por crianças. Já no período da tarde e da noite são adolescentes e adultos que tomam conta do local. Mesmo assim o público é muito misturado, não existe nenhum isolamento por faixa etária. Crianças e até garotas de programas ficam conectados a rede lado a lado.

Com a variação de público, os sites acessados vão dos infantis: Xuxa e TV Globinho até os mais procurados de relacionamentos como Orkut e MSN. As crianças são as que se mostram mais curiosas em relação ao mundo virtual, já que estão na fase de descobertas. É fácil observar a meninada olhando para o monitor do internauta que está ao seu lado e navegar naquilo que conseguir ver do computador do vizinho. Fabinho, o dono da Lan House comentou, "já flagrei garotas de programas mostrando partes íntimas de seus corpos através da Webcam, mas aí chamei a atenção delas e nunca mais vi elas fazendo isso. As mulheres usam esse serviço para fazer contato com estrangeiros e divulgar o turismo sexual", afirma Fábio.

O contato das crianças com os demais internautas, formados por pessoas entre 15 e 30 anos, é uma troca de informações sobre novos sites que despertam nesses jovens o interesse por um mundo desconhecido e, muitas vezes, perigoso. Como é o caso contado por Ana Cleia da Silva Moreira, 36, "uma vez um homem, 49, ligou para o telefone público aqui da comunidade e pediu para falar com a Marciana, minha filha de 14 anos. Ele disse que havia conhecido ela pela internet e que ela havia dito ter 24 anos". Quando perguntado a Marciana da Silva Xavier, 14, a garota não confirmou o depoimento da mãe sobre o telefonema, apesar de, "já conheci e fiquei com pessoas que fiz contato através da internet", afirma a menina.

Os Meninos e meninas que freqüentam a Lan House e que têm tão pouca idade parecem já estar na fase adulta. Acabaram-se os hábitos de ir brincar na rua. Ainda de uniforme da escola, Felipe N. de Souza, 11, e Elizabeth L. de Souza , 11, alunos da Escola Clóvis Beviláqua chegam e vão direto para a lan house do Fabinho. A menina praticante do surf usa a internet para marcar encontros com os amigos do esporte e conhecer garotos. Felipe, disse que, "antigamente eu ia para a Biblioteca Pública e usava os livros como fonte de pesquisa. Hoje, com chegada da lan house aqui na comunidade, uso a rede para paquerar e assistir vídeo clipe e acabo não fazendo os trabalhos da escola". As crianças, que antes faziam tarefas escolares de casa, hoje ficam na internet conhecendo várias pessoas sem nenhuma fiscalização e discernimento.

Distante do que os pais acreditam, as crianças estão usando a rede de forma errada e perigosa, é o que afirma a educadora da Comunidade, Isabel Cristina Lima, 42. Ela defende que o grande problema está no analfabetismo dos pais e na falta de informação sobre o universo da internet. "Pra mim a lan house afasta as crianças dos reais objetivos educativos. Não sou contra o uso da internet, mas é preciso ter limites e policiar os passos dessas crianças". Quando perguntado sobre a solução a ser tomada, Isabel respondeu "deveriam ser feitas ilhas digitais na comunidade com trabalho voltado para os pais, levando conhecimento as famílias com a internet, assim eles teriam controle dos filhos com o mundo virtual".

Os jovens internautas chegam a abusar dos limites na internet, e ainda, não existe nenhuma fiscalização. Para eles o que vale é ter o maior número de pessoas adicionadas à sua rede de amigos. Conhecem pessoas de outros estados e até de outros países. O deslumbre pelas fotos dos novos amigos toma a imaginação de meninos e meninas que até pouco tempo brincavam com bonecas e carrinhos. Em entrevista, os depoentes Marciana, Elizabeth e Felipe afirmaram que "não temos medo de conhecer pessoas estranhas, mas não passamos o nosso número de telefone, nem nosso endereço”.

O tempo que ficam na escola muitas vezes é inferior ao tempo que gastam na lan house. Algumas crianças ficam até seis horas conectados à internet por dia. Ivonete Lima Ferreira, 37, mãe de Elisabeth diz "minha filha freqüenta a lan house todos os dias e demora pra voltar para a casa. Todo o dinheiro que ela pega quer gastar na internet e eu não sei o que ela tanto faz por lá". O uso da internet na comunidade chega ser exagerado. O baixo valor cobrado entre R$1,00 e R$1,50 faz a diferença de números de acessos entre a Lan House da comunidade do Poço da Draga em relação a outros bairros.

Em conversa com o psicólogo, Davi da Silva Almeida Saraiva, 27, ele expõe os riscos do uso da internet para crianças, principalmente sem controle. "Muitas vezes o uso excessivo pode ser fruto de uma habilidade elevada em computação e interesse por conhecimento. O problema é que esse uso abusivo, sem nenhum controle traz mudanças de comportamento prejudiciais”, explica Davi. Além do mais, sendo a internet um meio de livre acesso sites pornográficos, o uso constante de jogos violentos e sites de caráter racista ou preconceituoso, dão ao jovem “idéias arraigadas e pouco críticas sobre a realidade”. Esse fato aumenta os índices de crianças fora da escola, “colocando-os no mundo marginal".


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